quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Desburocratização do sentir


Não se vive a termo, nem a prazo.
Sem risco, não há como dar passos.
Condicionar sentimentos faz disparar contradições.
Com ações e poucas promessas, enamora-se a dois, a três, a sós.

Rasgar cláusulas de contratos e dissolvê-las em rio.
Turbulências vêm e vão.
E porque não.
Sem tantas palavras e mais afagos se acham soluções para os laços.

Fazer da memória porta-retratos,
Em que se condensam todos os momentos sem muito cronometrá-los.
Seguir a caminhada com menos aspereza
De se ter pouco peso e carregar mais vivencias.

Leveza, o fundamento para se enlaçar.
Amor, um dos temperos.
Silêncio, página em branco para saber escutar.
Palavras, para ser naquele que te ouve.

Deixar ir.
Deixar vir.
Eis o pêndulo que traduz o movimento de quem sabe se entregar.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Mundo troncho pra chuchu e eu tô nele


No momento em que alguém vem despejar no meu ouvido papos caviar quando, na verdade, o papo está mais pra feijão com arroz e ovo frito, eu já vou logo desviando o eixo da conversa e temperando o suposto caviar alheio com muita pimenta de cheiro das baratinhas mesmo. Por quê? Oras, chega uma altura da existência humana em que qualquer cidadão comum apenas quer se relacionar com os outros de igual pra igual, sem muitas firulas, nem muitos frufrus. A ideia é conversar sem que as pessoas coloquem o carro na frente de quem anda de jegue, nem o rolex na frente de quem usa relógio comprado na Feira do Paraguai.
Alguém que comece uma frase afirmando que “a trans-subjetividade do mundo contemporâneo leva o homem líquido aos descaminhos da relação com a alteridade”, é digno de um gruindo: Hum? Essa frase é de tirar o apetite de qualquer cidadão “normal”. Depois ouvir citações de Lacan, Foucault, Nietzsche e de quebra Guattari e Deleuze, a cada 4 minutos, é de partir o coração de qualquer pessoa que quer dialogar sem se sentir em uma tese de mestrado repleta de citações nas notas de rodapé.
Ainda por cima, ter de ouvir críticas e instruções de como ter uma vida saudável e uma velhice tranquila. Ser discriminada por não comer tudo 100% orgânico e ouvir que eu sou uma capitalista selvagem só porque eu gosto de Mc Donalds, não dispenso uma coca cola e não leio todos os rótulos de alimentos que compro. Além disso, ouvir que a sociedade está pior porque existem pessoas como eu, que se graduaram numa universidade de qualidade, e ainda assim continuam financiando as empresas de junk food, que são responsáveis pela obesidade mundial. Afinal, eu sou a responsável pela escolha alheia? Será que os adultos do século XXI se tornaram retardados e precisam ser tutelados pelos cidadãos da geração saúde que "sabem" o que é bom para todos?
Sem dúvida, esses cidadãos bons de coração são uns dos maiores totalitários dos dias atuais: os naturebas e os intelectualóides. Ah, sem contar os religiosos nazistas de situação. Isso porque quem não se adéqua à crença ariana desses espécimes evoluídos tá no sal. Vai viver as amarguras no inferno das almas pecaminosas de Dante. Tudo se subverteu atualmente na lógica do amor trazida pelo cristianismo. As religiões se transformaram em sinônimo de intolerância aos que não pensam igual aos dogmas pregados. A liberdade de crença deve ser silenciada para não ser transformada em violência.
Da mesma forma, vejo o sujeito que esbraveja o socialismo de forma tão anacrônica. Afirmando que, na luta entre o capital e o trabalho, o empregado sempre é explorado. Mas quando se olha de perto o microcosmo do sujeito que se estapeia com quem pensa diferente dele, lá se observa a empregada doméstica do Che Guevara new generation sem ter a carteira assinada.
Será que eu preciso me internar em alguma clínica psiquiátrica pra me sentir mais incluída nesse mundo pós-moderno?  Ah, quer saber... Sou da seita do iê-iê-iê: “E que tudo mais vá pro inferno.” Salve Erasmo Carlos!

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Monólogo da paixão


Tu arranhaste-me por completo, deixaste marcas em cada canto e foste sem bater a porta. Estraçalhada fiquei ao me ver absorvida por um sentimento descontínuo. Desses que provocam dor, sem nem se ver escorrer sangue. Calor sem estar perto de fogo.
Tu embaralhaste tudo o que estava aqui dentro tão perfeitamente organizado. Eu ávida por percorrer as linhas cartesianas que eu supunha a vida me oferecer. Por que me atropelaste e me deixaste torta? Criei tantos mundos contigo, mas eles não tinham fundos. Me vi num beco beirando a fétida desordem dos embriagados.
Quando me olhei no espelho, me dei conta e gritei:
- Chega de drama, para de falar na segunda pessoa! Acaba com essa pieguice desmedida! Segue tua vida e não consulte livros de autoajuda, pois eles muito atrapalham. E tenho dito!

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Receita para virar balão

Pegue um cacto.
Agora sinta os espinhos.
Fure-se por todos os lados.
Deixe o sangue jorrar.
Sinta-se esvaziando.
Em seguida, espere os furos cicatrizarem.
Abra um corte e retire os ossos.
Costure-o. 
Restará apenas a pele e os globos oculares.
Peça a alguém para enchê-la (o) com hélio.
Flutue sem destino até um pássaro te bicar e você cair.
Quem sabe:
 no mar,
ou na mata,
 ou no asfalto.
Ou apenas no buraco escondido do seu imaginário.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Perguntas escalafobéticas e um pedido

Trocando em miúdos, pouco se sabe sobre as ordenações e os rumos dos passos.
Por que você é preto, ele é branco, seus olhos puxados e minhas ancas largas?
Sou feia, você bonito. Por quê?
É pra dar sentido à beleza que os feios transitam por aí?
Há regras cabalísticas para a definição do mocinho e do bandido? Ou são jurídicas as tais normas?
O moço gosta da vida na balança e o bando gosta dela fora de quadrados?
Quanto de ruim tem dentro de cada um?
Um pouco lá, muito cá?
Quantas geringonças juntadas dão sentido a isso tudo?
Um carro ali, uma cama aqui, um ar condicionado e um umidificador também. Talvez mais coisas? Ou nenhuma coisa?
Quem te falou que para sorrir é preciso ler e ver e gritar? Quem sabe nada disso sirva pra tanto?
Sem muito me explicar, só uma coisa eu lhe peço:
Deixa a secura fazer com que seja possível sua pele ser desenhada por suas unhas.