terça-feira, 30 de outubro de 2012

Avoados, uni-vos!

foto retirada do google

Tudo é desculpa para a distração. Gracejos do vento. O canto dos pássaros. Histórias imaginadas que percorrem ruas fantásticas. Repentes inteiros recortados. Há grandeza em quem vive nesse mundo interior. Pouco compreendido por aqueles que vivem no mundo exterior: atentos a todos os sinais, a todas as palavras, inseridos na realidade a pleno vapor. Estes seres viciados em cotidiano repelem os avoados. Tiram sarro de seus   dizeres desconexos, pois bons desatentos são esses que, ainda que o bonde esteja andando, tentam se sentar na janelinha. Inventaram uma sigla para descrevê-los, mas me recuso a pronunciá-la. A verdade é que aqueles que voam conseguem sobreviver sem categorias, pois da desatenção se extraem belas poesias.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Os ASPONE

ilustração retirada do google


Para ser um ASPONE, não precisarás ter grandes méritos acadêmicos, nem um currículo repleto de referências na labuta diária em alguma empresa ou comércio ou escritório. Bastará apenas saber se relacionar com quem tem poder, puxar o saco desse alguém. Fazê-lo acreditar em sua importância perante a sociedade. Ser agradável.
Se fores uma loira bonita e malhada, já alcançarás pontos necessários para galgares tal função. Para ti, bastará sorrir em dias de debates em audiências públicas, carregando papéis, para o teu chefe retribuir-lhe com um sorriso e alguma atenção.
Se fores filho ou até parente ou amigo de um figurão, já estarás a salvo em alguma repartição. Porém, se a natureza não o dotou de tais atributos físicos, nem relações de sangue ou fraternal, terás de investir no verbo, para inflar o ego daquele para quem trabalharás. Assim, serás o ASPONE-MOR. Aquele que por méritos próprios conseguiu o título de puxa-saco fundamental.
Assim se observa muitos setores do nosso país arcaico e, ainda hoje, ao caminhar por alguns corredores da Administração Pública encontram-se os emblemáticos Assessores de Porra Nenhuma – ASPONE. Não sei como até o momento não recebi via Facebook  o dia comemorativo de tal profissão tão consagrada em nossa nação.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Balança do desejo

ilustração retirada do google

Não transparecer paixão exacerbada para não assustar.
Quando se mostra por completo o desejo,
O outro pode se espantar.
Daí a tênue linha entre revelar e esconder.

O inconsciente prega peças.
Rejeitam-se amores de R$ 1,99:
Aqueles que vêm fácil, sem muita sonegação.
Por outro lado, segue atraindo-se por amores de R$ 1.000.000,00:
Aqueles que de tão difíceis são inalcançáveis, porque não aceitam negociação.

- Aprecio-te, desejo-te, amo-te.
Cale-se! Fale apenas para o seu estômago tais palavras,
Porque pode despertar o pavão alheio
E afastar a alma que ainda não se conhece por inteiro.

Para não causar espanto, vá gotejando, aos poucos, em olhares seus desejos.
Não se sabe o quanto se pode revelar, aí está a arte de amar.
No cotidiano bambo do bailar.
Tenta-se apertar sem muito sufocar.
E soltar o parceiro delicadamente para a dança continuar.

Mas de tudo o que foi dito,
Nesse poema esquisito.
Não há matemática para explicar
O simples começo de se interessar
Por aquele alguém que te transformará.

domingo, 14 de outubro de 2012

Ah, aquela cidade de concreto

imagem retirada do google

           O formato geográfico da cidade onde nasceu é uma metáfora que explica bem a identidade daquele lugar. Desde o primeiro trator que percorreu o espaço escolhido para se iniciar a construção da cidade, esta não deixara de ser um local de chegadas e partidas. Lá qualquer endereço sintetiza um ponto cardeal. É como se a rosa dos ventos penetrasse os cidadãos que ali habitam e fizesse com que esses falassem, a partir de orientações cartográficas, os endereços de onde pretendem ir. Poderia se dizer que o GPS é um instrumento dispensável por lá.
A cidade vista bem lá do alto se transforma em um aeroplano. O satélite capta a imagem e projeta a personalidade da cidade: espaço de convergência de pessoas de diferentes regiões do país e, ao mesmo tempo, lugar de dispersão de seus habitantes provisórios e os de nascença. Os filhos dessa cidade acabam tendo um pé em um Estado e o outro, noutra região. Seriam todos filhos de Antônio Brasileiro, como diz a canção de Chico Buarque. E nessa mistura de sotaques, acabou-se por podar os regionalismos de cada lugar e a fala dos que lá residem foi se modelando feito barro, limando-se os acentuados regionalismos do norte, sul, leste e oeste do país, tornando-se um português que é a mistura de todos os sotaques atenuados.
Seus prédios parecem caixinhas de fósforos dispostas de forma diversa em cada quadrado delimitador de uma quadra. Muitos visitantes assim que desembarcam e percorrem a cidade lhe dizem: “Todos os lugares parecem se repetir. Muitas vezes nem sabemos reconhecer em que quadra estamos. Não há nada de peculiar entre um endereço e outro”. Pelo menos essa era a primeira impressão, mas depois de algum tempo, os repetidos retângulos habitacionais passavam a ser vistos a partir das peculiaridades e sutilezas de cada canto.
O eixo que recorta as asas do lugar acaba sendo uma auto-estrada em que se chega e que se vai embora. Esse lugar cartesiano não é para todos, é preciso de alguns ingredientes para se adaptar ao incomum das avenidas largas e espaços setorizados. As ruas identificadas por letras e números, ao invés de nomes, traz estranhamento aos forasteiros. A falta de pedestres pelas calçadas é para alguns, não acostumados com essa lógica de não-ocupação do espaço público, sinônimo de solidão. Para parte desses recém-chegados a falta de transito humano vai dilacerando seus dias e fazendo com que o banzo da terra natal instale-se, para então se retirarem da cidade repleta de balões e tesourinhas, dizendo-lhe: “Adeus, para cá não volto mais”. Mas o que faz outros ficarem feito ela?
A quadra em que ela cresceu era uma das menos urbanizadas na época de sua infância. Tinha apenas quatro blocos e uma entrada incomum, para o padrão urbanístico da cidade, pois a entrada dava-se pela comercial. E logo na rua de acesso havia uma banquinha de jornais amarelada, onde ela comprava todos os dias “xaxá de banana”, uma balinha com um macaquinho ilustrado na embalagem, e folheava gibis.
Cada quadra, daquela cidade, era habitada por servidores públicos de distintas instituições que compunham o Estado. Tinha-se a quadra dos funcionários do Banco do Brasil, a dos militares, a dos ministros dos Tribunais e assim por diante. A quadra dela era a dos professores da Universidade pública local. Por isso, desde a infância percebia que muitos de seus amigos tinham pais com sotaques de diferentes partes do mundo e de diversas regiões do país, assim como seus pais. Era como se aquele espaço se tornasse um caldeirão cultural. A cada visita que fazia a um de seus amigos, uma nova realidade cultural se apresentava aos seus olhos curiosos.
As áreas verdes da sua quadra eram transformadas em um playground sem parquinho. Naquela época, a terra vermelha, a grama e o concreto dos blocos que faziam parte da arquitetura da quadra eram os espaços ocupados pelas crianças. Diariamente, a zoada tomava conta do lugar: bete, pique esconde, pique-bandeira, polícia e ladrão, amarelinha, pique-pilastra, bola de gude, dentre tantas outras brincadeiras faziam a festa das crianças.
Era um período em que havia os “bate-bolas”: Um grupo de jovens de classe média que saia pelas quadras com pedras dentro de meias de tecido para bater nas crianças que viam pela frente. Assim que alguns de seus colegas viam esses grupos gritavam: “Olha lá os bate-bolas”. Todos corriam desesperados para suas casas e só voltavam a descer depois de algum tempo. Hoje não mais se ouve falar em “bate-bolas”, mas ainda se vê algumas crianças debaixo dos blocos, nem tanto como antes. Talvez seja a síndrome da internet, que vem transformando as crianças em sedentários precoces.
Nessa cidade os períodos de seca fazem os narizes escorrer sangue e os lábios racharem. A paisagem também é transformada nessa estação do ano. A grama deixa o seu verde característico e se torna bege. As folhas das árvores caem dando espaço aos seus galhos contorcidos, em contraposição aos ipês que florescem nessa mesma época, pincelando diferentes tons vibrantes no espaço descolorido. A poeira da terra avermelhada sobe, misturada com a poluição, dando ao ar um tom marrom, o que faz o sol ficar mais dourado quando o dia vai deixando de ser dia. A respiração pode falhar nessa época, fazendo com que os pouco adaptados desmaiem ou sintam dores fortes de cabeça.
De alguns amigos e parentes de fora, ela sempre escuta: “Você mora na ilha da fantasia”. Mas basta parar em um semáforo, para essa frase cair por terra e se perceber que o país desigual também é observado naquele lugar. Não é por nada mais, nada menos que as cidades satélites absorvem os trabalhadores do espaço carente de transporte público. Esses satélites habitacionais vão contornando aquele aeroplano e mostrando que o índice de desenvolvimento humano na cidade de concreto está muito aquém do ideal. É só observar a cidade satélite que cresceu em torno do lixão da cidade.
De fantasia só lhe restou as máscaras que dão identidade aos “mensaleiros”. Esses tentam dar um nó jurídico na Suprema Corte para saírem à procura das ilhas da impunidade. Talvez a ilha que tantos apregoam seja mais um reflexo da imagem de políticos pouco afeitos ao espírito público, que a cada gestão da cidade, mostram o que não deve ser feito no jogo político: pagamentos de propinas realizados por empresas privadas para vencerem licitações; inúmeros cargos comissionados distribuídos entre apadrinhados políticos; patrimônio pessoal desses gestores públicos muito superior ao que seus salários podem comportar. Patrimonialismo na veia, alguns diriam. Clientelismo, também. Fisiologismo latente. Dinheiro espalhado em cuecas, bolsas, meias.
Cá está ela tecendo essa história no saguão de espera do aeroporto. Agora é ela quem se despede, sem dizer adeus, e sim um até logo àquela cidade que a recorta, não tendo data para retornar. Ela tão afeita aos espaços públicos habitados e crítica dessa cidade tão dependente de carros, com transporte público precário. Mas, ainda assim, uma cidade que lhe permitiu se desvendar aos poucos na vastidão de seus vazios, nos silêncios de seus gramados. Ela que conhece todos os cantos e satélites daquele quadrado instalado no centro do seu país. Nesse momento, ela se retirará da cena cartesiana, do concreto da arquitetura daquele espaço, para se perder e se reencontrar em outros lugares.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

Reviravolta

imagem retirada do google

Escolhas não são teleguiadas.
Para o desatino dos que creem em linhas já traçadas,
Inexiste destino.
O acaso promove o encontro.

Para curar a dor de amar,
Outros amores são bem-vindos,
Porque do abismo se sai assim,
Dizendo sim a novas chances.

Abrir as portas é promover contato.
Mas de quando em vez,
Se você se der conta
De que um amor passado te embriagou de modo singular.

Porque não voltar algumas páginas
E indagar àquele que te sedou de amor a conta-gotas:
Se eu disser que me arrependo, você me dá uma nova chance?

De duas, uma:
Ou se esfacelará diante de um não.
Ou sedimentará uma vida no ato de recuar.

Na balança das escolhas,
Diante da possibilidade de um sim:
Tudo vale a pena, se a alma não é pequena.

sábado, 6 de outubro de 2012

Com o rei na barriga, somos avessos ao avesso

imagem retirada do google



Colocar pontos de interrogação em posicionamentos firmes não é tarefa fácil. Destroçar verdades quase intocáveis é deixar o interlocutor sem chão. Apontar caminhos pode ser visto como presunção. Debater de forma crua, sem muitos floreios, desperta a agressividade alheia por um lado, e por outro pode acuar os convivas. No decorrer da caminhada em que essa ausência de questionamentos ocorre, vamos consolidando o laço com aqueles que pensam de maneira semelhante. E, quando nos damos conta, estamos a debater em círculos, reafirmando nossos posicionamentos sobre tudo e todos. Isso porque é mais confortável. Sair da caixa dos comuns é “perigoso”, pois a divergência pode corroer o ego.
Com o tempo passando a galope, parece que corremos mais e mais para alcançar a linha de chegada do pensamento uniforme. Sem perguntarmos os porquês de estarmos correndo naquela direção.  A crítica destrinchadora passou a ser artigo de luxo, para quem quer ouvi-la. Ao nos filiarmos a determinadas formas de ver o mundo, passamos a rejeitar qualquer forma de argumento que possa desestabilizar aqueles conceitos cultivados no decorrer de uma vida. Com isso nos amalgamamos em esferas do pensar, sem indagar. Pasteurizamo-nos em grupos marteladamente esquematizados.
Em tempos de julgamentos e eleições decisivos na República (das Bananas? Ou já podemos dizer Federativa do Brasil?), vemos que quem diverge, em certa medida, é escorraçado. O Mensalão está aí. Traduz uma forma de fazer política no Brasil. Uma política mercadológica em que a ideologia é comprada por dinheiro vivo. Não nos esqueçamos da compra de votos, durante o governo Fernando Henrique Cardoso também, em que foram negociados inúmeros votos de parlamentares a favor da reeleição para cargos do Poder Executivo – Presidente da República, Governador de Estado e Prefeito. Pena que naquele período, tínhamos um “Engavetador” Geral da República, que fazia vistas grossas.
Atualmente, nessa trajetória da formação de um senso crítico, creio eu, mais apurado, estamos vendo um julgamento em que a punição a esse tipo de fazer política está sendo realizado. Ou seja, quem sabe a partir daí haja uma política menos de compra e venda de votos e mais uma política do debate de opiniões que reflita a complexidade desse país continental.  Como observamos, a compra de votos permeia todos os partidos, do PT ao PSDB. Depois do julgamento do mensalão do PT, que venham os demais: mensalão do PSDB de MG, o mensalão do DEM do DF, Daniel Dantas e por aí vai.
Desfazer essa forma de fazer política é consolidar a democracia, para tanto uma Reforma Política se faz necessária. O país merece. Nós merecemos. E que o debate venha para problematizar esse modo “toma lá, dá cá” de se fazer política.